Doechii é a nova voz do rap?
- LUIZA HELENA DA ROCHA
- 18 de dez. de 2024
- 3 min de leitura
Indicada ao Grammy Awards em três categorias, a rapper Doechii atingiu um novo patamar na carreira ao lançar o álbum “Alligator Bites Never Heal” em agosto deste ano.

O projeto explora as vulnerabilidades da artista e resgata o que vi muita gente chamando de os “velhos tempos do rap, quando artistas rimavam de verdade”. As comparações, é claro, remetem ao estilo de produção boom bap, um subgênero do rap popular no início dos anos 1990 - muito bem explorado no álbum. Mas o que a torna uma das maiores revelações de 2024 vai muuuito além disso.
Indicada em “Best Rap Álbum”, “Best Rap Performance” e “Best New Artist” para o Grammy Awards 2025, a rapper atraiu a atenção de artistas como Kendrick Lamar , Solange Knowles e Tyler, the Creator, que declararam apoio público à artista. O último, aliás, a convidou para colaborar na faixa “Balloon”, parceria também com Daniel Caesar para o álbum “CHROMAKOPIA”. Foi a partir dessa faixa que eu conheci a rapper e procurei saber mais sobre suas músicas e apresentações.
Quando terminei de escutar a discografia dela, só pensei em palavras como: afiada, autêntica e fod*. Em um cenário global do rap aquecido pelas rivalidades do game e reivindicações de grandes samples em produções elevadas, a rapper Doechii veio na contramão das principais tendências mercadológicas e lançou um dos – indiscutivelmente – melhores álbuns do gênero de 2024.
Aliás, a autenticidade de Doechi não é de agora. A rapper começou na música em 2016, publicando faixas no Soundcloud. Em 2020 ela lançou o primeiro EP “Oh The Places You’ll Go", onde misturou rap, dance, house e hip hop – gêneros que veio se aprofundar nos anos seguintes de carreira. Quando lançou “Crazy”, em 2022, a potência artística dela ficou clara ao público. Não há limites quando se trata de criatividade.
E de artistas que não se limitam quando se trata de arte, ela me lembra muito os primeiros anos de carreira de Nicki Minaj – que, durante uma época, recusou todas as ‘caixinhas’ impostas pela indústria. Embora haja fórmulas de se fazer um rap de sucesso como também há para receitas de bolo, Doechii recusa seguir nada que seja além de sua verdade. Um aprendizado que talvez tenha tido de Doja Cat, artista para quem abriu a turnê na ‘Scarlet Tour’ (2023), e que cantou exaustivamente o hit global pop ‘Say So’ por uma suposta pressão da gravadora.

Recentemente, a rapper se apresentou no Tiny Desk Concert , um programa de música voltado a apresentações intimistas. Com uma banda negra, Doechii cantou faixas da mixtape, além de relembrar o início da carreira. Sendo sincera, acredito que tenha sido um dos melhores “Tiny Desk” que eu assisti, além de que ela é extremamente bonita e performática (que isso? um filme?).
Ainda na mesma semana, a artista também se apresentou no The Late Show With Stephen Colbert, onde construiu uma performance repleta de simbolismos que celebram sua negritude feminina ao hip hop.
Posso dizer que, seja ao vivo ou em estúdio, o público pode testemunhar em cada lançamento a capacidade de Doechii de segurar as barras de um rap em qualquer gênero musical. A cadência da rapper ao pronunciar cada palavra de cada verso, sem necessariamente precisar de pontos de apoio, enquanto diversifica o flow durante as apresentações, deveria se tornar parâmetro para qualquer rapper da cena.

Por fim, seja nos gêneros house, dance music, hip hop ou até mesmo em um punk explosivo, Doechii mostra que seu caminho na indústria musical é promissor e (muito) versátil. A mistura de estilos que narram suas múltiplas experiências é apenas uma amostra da capacidade artística da rapper de explorar diferentes gêneros musicais.
Honestamente, um grande respiro em meio ao comodismo da indústria, que aposta nas armadilhas fáceis de engatar um hit instantâneo e pouco na capacidade de se superar a partir das experiências pessoais.
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